A popularidade dos carros elétricos cresce a cada dia, e com ela, a necessidade de infraestrutura de recarga em condomínios. Se você mora em São Paulo (especialmente em regiões como Alphaville, Barueri) e pensa em ter um carro elétrico ou já tem e quer instalar uma tomada na sua garagem, este guia é para você. Vamos descomplicar o processo, abordando desde as normas de segurança até o papel do síndico e da assembleia.
Atenção Inicial e Ponto Chave: Consulte o Corpo de Bombeiros ANTES!
Antes de qualquer iniciativa e para evitar gastos e esforços desnecessários, nossa primeira e mais importante recomendação é: busque informações claras sobre as exigências do Corpo de Bombeiros Militar do Estado de São Paulo (CBPMESP) para o seu condomínio.
Por que isso é tão crucial? Porque muitos condomínios existentes, especialmente os mais antigos, podem não possuir a infraestrutura de segurança contra incêndio necessária (como distanciamento de vagas, sprinklers, ventilação forçada, sistemas de detecção de fumaça) para a instalação de carregadores de veículos elétricos. Sem a capacidade de atender a essas normas, a instalação pode ser inviável ou exigir obras de adequação de alto custo e complexidade.
Uma consulta prévia a um engenheiro especialista em segurança contra incêndio (que possa interpretar as Instruções Técnicas - ITs do CBPMESP para o seu caso) ou até mesmo uma consulta formal aos Bombeiros, se possível, pode economizar tempo e dinheiro, fornecendo um panorama realista das exigências para o seu edifício.
Entendendo o Cenário Legal e Técnico no Estado de São Paulo
Atualmente, não existe uma Lei Federal que tenha alterado o Código Civil para regulamentar especificamente a instalação de pontos de recarga em condomínios. Isso significa que as decisões se baseiam em uma combinação de fatores:
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Direito do Condômino: Você tem o direito de fazer benfeitorias em sua propriedade, mas com limites claros: não pode comprometer a segurança da edificação ou alterar a fachada e as áreas comuns sem a devida aprovação.
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Normas Técnicas (ABNT): A ABNT NBR 17019:2022 é a sua principal bússola técnica. Ela detalha os requisitos para instalações elétricas de baixa tensão destinadas ao carregamento de veículos elétricos. Qualquer projeto deve segui-la à risca.
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Corpo de Bombeiros (SP): As Instruções Técnicas (ITs) do CBPMESP são obrigatórias em todo o Estado de São Paulo. Elas estabelecem as medidas de segurança contra incêndio e pânico, e estão em constante atualização para incluir ou refinar as exigências para garagens com veículos elétricos (ex: distanciamento, detecção, combate a incêndio, ventilação, pontos de corte de energia).
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Legislação Municipal/Estadual: Algumas cidades (como São Paulo, com a Lei Municipal nº 17.336/2020 para novas construções) ou estados podem ter leis específicas. Para Barueri e Alphaville, até o momento, não identificamos uma legislação municipal específica para condomínios já existentes neste tema. Portanto, a ABNT e as ITs dos Bombeiros são as referências primordiais, juntamente com as regras internas do condomínio.
Guia Passo a Passo para o Condômino e o Condomínio
Seguir este roteiro garantirá que o processo seja transparente, seguro e legal:
Passo 1: Pesquisa Preliminar e Diálogo Inicial
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Condômino: Converse com o síndico para entender as regras atuais do condomínio e manifestar seu interesse.
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Condomínio (Síndico/Administradora): Antes mesmo de receber um projeto do condômino, é altamente recomendável que o condomínio busque um engenheiro especialista em segurança contra incêndio ou faça uma consulta formal ao CBPMESP para entender as adequações necessárias para o perfil do edifício. Isso evita que projetos inviáveis sejam elaborados e gera economia de tempo e recursos para todos.
Passo 2: Contratação de Profissional Habilitado (Pelo Condômino)
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O condômino interessado deve contratar um engenheiro eletricista ou uma empresa especializada em infraestrutura para veículos elétricos. Este profissional será o responsável técnico (com ART - Anotação de Responsabilidade Técnica) pelo projeto e pela execução da instalação.
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O projeto técnico deve ser detalhado e, além das especificações elétricas, deve demonstrar como serão cumpridas todas as exigências de segurança do Corpo de Bombeiros (distanciamentos, detecção, sprinklers, ventilação, pontos de desligamento de emergência, etc.).
Passo 3: Análise do Projeto pelo Condomínio
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O síndico ou a administradora deve receber o projeto completo, com a ART.
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É crucial que o condomínio, se não tiver a expertise interna, contrate seu próprio engenheiro eletricista para analisar o projeto do condômino. Essa análise independente verificará a conformidade com as normas, a viabilidade técnica e os impactos na infraestrutura geral e na segurança do edifício.
Passo 4: Deliberação em Assembleia (Geralmente Essencial)
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Mesmo que a tomada seja em vaga privativa, a instalação quase sempre exigirá aprovação em Assembleia Geral de Condôminos. Isso ocorre porque:
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Haverá impacto na rede elétrica geral do condomínio (aumento de carga).
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Pode ser necessária a passagem de fiação por áreas comuns.
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Exigirá adequações de segurança (como instalação ou reforço de sistemas de combate a incêndio ou ventilação) que beneficiam a todos, mas geram custos coletivos.
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Será preciso regulamentar o uso e o rateio dos custos de energia.
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Quórum de Aprovação: Para obras classificadas como "benfeitorias úteis" (que modernizam ou facilitam o uso do condomínio), a aprovação geralmente exige 2/3 dos votos dos condôminos presentes na Assembleia. Essa porcentagem elevada confere maior segurança jurídica à decisão e garante que a maioria esteja ciente e de acordo com as implicações.
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A assembleia também deve aprovar o método de medição individualizada do consumo de energia para cada carregador, garantindo justiça na cobrança.
Passo 5: Execução da Obra e Vistoria
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Após a aprovação em assembleia, a instalação deve ser executada rigorosamente conforme o projeto aprovado e as normas técnicas.
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O condomínio pode solicitar uma vistoria final e a entrega de um termo de responsabilidade técnica pela execução da obra.
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O AVCB (Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros) do condomínio pode precisar ser revisado ou atualizado após a instalação, dado o impacto na segurança contra incêndio.
Considerações Finais e Proteção do Condomínio
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Segurança Acima de Tudo: Se as exigências de segurança dos Bombeiros (distanciamento, sprinklers, ventilação etc.) não puderem ser atendidas sem comprometer a estrutura ou exigir investimentos inviáveis para o coletivo, o síndico e a assembleia têm o dever de proibir a instalação. A vida e o patrimônio são prioridades.
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Comunicação Transparente: Síndicos, administradoras e condôminos devem manter um diálogo aberto durante todo o processo.
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Documentação Completa: Mantenha todos os projetos, laudos, ARTs e atas de assembleia organizados.
A instalação de tomadas para carros elétricos é uma evolução importante para os condomínios. Ao seguir este passo a passo e priorizar a segurança e o diálogo, seu condomínio estará apto a abraçar essa nova tecnologia de forma responsável e eficiente.
Autor
Geison Monteiro de Oliveira
Advogado e Especialista Condominial